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sábado, 6 de novembro de 2010

Sobre a vida

Começava a sentir o frio da noite... já era noite? Nem havia me dado conta. Surpreendi-me com os fatos. Deixei estar... não havia mais muito tempo, não é mesmo? Ouvia o coração pular sofridamente dentro do meu peito. Seu trabalho descompassado já era comum havia algum tempo, mas hoje, eu sabia que estava no fim...

Não quis me sentar como outrora fazia nessa situação. Espera! Nunca havia estado em situação similar. Mesmo assim não me sentei. Escorei-me na pilastra central do lugar. Ouvia o gotejar que saía de mim. Sentia a vida escorrer-me pelas feridas. Não dava tempo de tentar mais nada. Sabia que aquele lugar seria meu túmulo. Nada de flashes do passado, nada de coisa nenhuma. Onde estaria a tal luz? Sorri comigo mesmo ao pensar na luz... mesmo a beira da morte aquilo me soou cômico. Tossi um sorriso. Doído, mas um sorriso. Alguém falou-me:

— Consegues rir numa situação como essa? – perguntou-me a voz.

Não consegui responder de imediato, sentia o sangue a me tapar as vias respiratórias. Engasguei-me com a tentativa e tossi alto e dolorosamente. O sangue espirrou na pilastra à minha frente. Ouvi o som de passos se aproximando. O caminhar cessou. Estava ao meu lado. A voz rouca e grave ressoou em meus ouvidos por mais uma vez:

— Do quê estavas rindo? – insistia a voz em saber da minha graça.

— Eu ria... ria da morte... de uma certa forma – expliquei-lhe cansado.

— Aposto que ela também riria de ti – disse firme.

— Não duvido! E sinta-se à vontade para rir também – disse eu, com desdém.

Ouvi uma risada abafada. Nem me esforcei em ver nada. Minha vista já estava praticamente escurecida havia algum tempo. Tomava ar como se tivesse acabado de subir uma montanha. Tudo doía muito e era muito difícil. Não resistia, deixava ser. Permitia-me partir. Não contestava, não reclamava. Eu estava certo de que não mais ficaria ali...

— Por que não sentas, meu caro? – perguntou-me a voz – Parece-me esgotado.

— Não quero descansar nos meus últimos minutos de vida – praguejei.

— Tu és um daqueles que acredita em descansar após a morte?

— Não acredito na morte – pausei buscando ar – ninguém vai para lugar algum quando morre.

— Daria tua vida por essa crença? – perguntou-me irônica, a voz.

Sorri mais uma vez dolorosamente. O sangue, o que ainda restava dentro de mim, escorria-me nos cantos da boca. Meu corpo todo latejava. Mal me sustentava de pé. Só conseguia permanecer alí, escorado e em pé, por teimosia mesmo.

— Sabe... eu daria minha vida por qualquer coisa. Sei que não existe a imortalidade da alma... sei que não vou para lugar algum... e principalmente, que não vou durar mais nada... só uma coisa me consola: o fim.

O dono da voz começou a caminhar novamente. Circulava-me, lentamente, assim como meu tempo se escoava. Ouvia-lhe os passos, nada mais que isso. Eram pesados. Por fim parou e disse:

— Muitos são tolos, muitos são idiotas... mas tu... tu não mereces o descanso, o fim. E terá de mim, o tempo necessário para mudar teus pensamentos. Viverás até que eu decida que devas partir. Uma vez a cada sete dias eu voltarei para que tu me convenças de que mudaste teus conceitos. Quando acreditares em mim, dar-te-ei a paz. Enquanto isso, sofra a dor da morte, vivo, como estás agora.

E tendo dito isso, partiu. E toda aquela angustia e sofrimento, perpetuaram-se para quase todo o sempre. Até o dia em que eu, finalmente, aceitei a verdade... mas isso é uma outra história.

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