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domingo, 12 de dezembro de 2010

Conto número 2 - Notícia

Em pensar que às vezes nem sempre é bom saber o que se passa consigo mesmo. Não foi diferente comigo. Um dia, estava eu nos meus afazeres do trabalho – eu trabalhava num Jornal, organizando e formatando páginas dos periódicos – quando li uma notícia que me chamou muito a atenção. Era de um dos repórteres do serviço, um dos novos. Eu o conhecia pessoalmente – afinal, quem eu não conhecia? Chamava-se Carlos. Era um rapaz recém formado. Não tinha vínculos com o Jornal ainda, estava estagiando, de experiência. Bom, Carlos trabalhava alí já havia um mês e meio. Mesmo assim, eu já o conhecia suficientemente para chocar-me com a notícia que acabara de ler. Imprimi em uma lauda e reli detalhadamente o que já havia lido duas vezes pela tela do computador. Era inacreditável. Fiquei perplexo e estupefato. Não me contentando, reli novamente e mais uma vez. Quando, insatisfeito com o que lia, tentei reler mais uma vez, não o pude fazer por ter minhas mãos trêmulas e frouxas. Sentei-me sem ao menos ter notado que havia levantando. Cocei a cabeça matutando as ideias. Meus olhos giravam do papel para a tela, do papel para a mesa, do papel para as pessoas a minha volta. Meu transtorno me deixou suado, quase pingando. Procurei minha garrafinha de água e pela primeira vez, em trinta anos de serviço, eu não a encontrei. Abalado com a notícia que transitava meus pensamentos, comecei a desforrar minha impaciência na garrafa sumida. Olhava até debaixo dos papéis onde seu volume não caberia. Revirei a minha mesa como se isso fosse me trazer paz e sossego. Por fim, quando ela já estava um caos, lembrei-me do Carlos e de que fora ele quem havia escrito a notícia que transmutara a minha vida. Num passe de mágicas, a garrafinha sumida permaneceu como antes: sumida. Minha total atenção agora era para aquele sujeito que, pensando bem, eu não gostava quase nada e mal conhecia.

Levantei de um pulo da cadeira – a qual eu nem sequer havia percebido que estava sentado – já gritando por Carlos. O barulho era uma coisa tão comum na redação que sequer me ouviram chamando seu nome. Repeti com mais ênfase: “ô Caaarlos” – até alonguei sua primeira vogal como a testar-lhe a acentuação da palavra. Novamente não me deram ouvidos. Comecei a rodar minha cabeça de um lado para o outro. “Onde anda aquele maldito moleque?” pensei comigo mesmo. Não o via por ali. O jeito era rodar o local todo no seu encalço. Assim o fiz, procurei-o primeiramente na sua mesa. Nada daquele peste. Depois fui até a cozinha – pensei que como estava perto da hora do lanche que ele poderia estar por ali. Não estava. Lembrei-me daquele ditado idiota que todos sempre usam – inclusive eu – ‘quem tem boca vai a Roma’, e comecei a perguntar pelo Carlos. O problema era que todos estavam mais ocupados do que o normal naquele dia. Ninguém parava pra me responder e isso estava me matando. Cansado de rodar de lá pra cá sentei-me num banquinho perto dos banheiros. Eis que sai de lá de dentro do banheiro, o Rodrigo – amigo de faculdade do Carlos – conversando com um dos chefes de redação. Prestei atenção no que diziam, esperando para poder perguntar do fulano e pesquei uma frase solta: “coitado do Carlos. Ficou em casa arrasado com o fato, mas, mesmo assim, fez questão de escrever a nota e enviar pra redação. Isso é que é amigo!” “Então o danado estava em casa? Que molenga! Escreve um absurdo daqueles e ainda fica em casa como se fosse vítima.” – falei. Antes que o Rodrigo pudesse afastar, ouvi um outro dizendo: “Ô, Digão! Quem vai limpar a mesa do Souza? Tá tudo esparramado.” Só me faltava aquela; confuso mas nervoso interpelei: “que limpar a minha mesa o quê, ou?!” Mas não me dando ouvidos, o chefe do Rodrigo continuou o que ia dizer: “Deixa tudo lá, Armando. A esposa do falecido vem buscar tudo. Não esquece de fazer uma cópia da homenagem que o Carlos escreveu pra hoje pro Souza, tá?” Pensei na hora: “Até que o Carlos não era de todo um mau sujeito.”

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